"não poderia jamais exercer um perfil de I., porém, uma panorâmica de I., isso se pode exercer, uma malha de cenas, esquetes, vinhetas, coisas de I. que posso dar a vocês mas que, não posso deixar de admitir, estarão sempre subjugadas ao perfil de I. que não posso, nem nunca poderei exercer. O que dizer disso? Não faz a menor importância, não, a importância não se faz entre vocês, muito embora me atormente, muito embora me ponha em fúria contra I., que especificou em seu bilhete de suicídio, que não era tanto um bilhete, mais uma novela de suicídio, que deixou lá, com todas as letras, ESPECIFICADO, que ninguém deveria fazer seu elogio fúnebre a não ser eu, que cada qual tem a sua efígie de I. a queimar nessa praça tão repugnantemente pública da morte alheia. Mas eu dizia, uma panorâmica de I., é como se encontrar em território do próprio, todos os presentes certamente se recordam da paixão de I. pelo cinema, se não me engano, quando de seu quando de sua passagem MORTE quando de seu não estar mais aqui I. estivera roteirizando filmes de baixo (quiçá inexistente) valor artístico sob pseudônimo e gastando seu ordenado em livros que só leria daqui a vinte anos, artigos de vestuário antiquados e
daqui a vinte anos I. continuará não estando aqui, mas será diverso, isso, uma modalidade mais generosa de não estar mais aqui – I. será o eco rematado de I., a lembrança da lembrança dum rebôo que tremeu certa noite de março, nesta outra noite de março semelhando, é estranho, um veludo de carícia pluma ou mesmo unha quando dela se sabe fazer uso apropriado, um correr de dedos por sobre a idéia que cismamos em fazer de alguém ou qualquer coisa, I. nos será tão próximo quanto um estranho com o qual esbarramos na saída da Carioca indo pro trabalho, I. será tão acariciante quanto alguém que se esqueceu
é possível fazer cinema de I., mas vale a pena fazer cinema de I.?"
(trecho de "Elogio Fúnebre Ao Amigo Que Se Matou")
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