Supersonismo. Eu estava tomando um chope na Taberna do Leme, lendo “Os Últimos Dias de Paupéria”, e de repente-não mais-que-de-repente um som como nunca ouvi antes, parecia avião perto demais, longo demais, e as coisas como andam pelos ares hoje em dia – bom, tentei localizar a matriz da balbúrdia, mas só via gente apontando. Tentei mirar na direção, ou direções, indicada, ou indicadas, não vi nada, em parte porque o toldo me impedia, mas é recorrência, isso, forçoso admitir. Os amigos sempre dizem: “Veja, um enxame de abelhas africanas!”, e eu: “Onde? Onde?”. Quando dou acordo, se chego a tanto, já passou. Eu nunca vejo nada.
Um jato que me varejou as idéias hoje, enquanto vadiava pela Orla: das duas uma: doze ou sessenta e sete, primavera de dentro ou cortejo de outono, porque, convenhamos, quem pode se dar ao luxo de ficar vadiando pela Orla às treze horas atrás dum boteco amigável? Mas. Nem tanto ao céu nem tanto ao mar, fato é que estou em férias, e já saldei o tributo de uma semana acamado, paracetamol, vitamina C e rios caudolosos de Kleenex. Questão de decência passar a primeira semana de férias com o bigode cheirando a Vick Vaporub. Mas voltando. É esquisito. Dou-me a luxos com os quais não me dou, em absoluto. Por exemplo, eu poderia estar lendo Kierkegaard. Todo a gente poderia estar lendo Kierkegaard agora. Rapaz, seria uma festa.
(Estou esperando dois telefonemas. Um é publicável. Outro não. Não levo muita fé em nenhum. Hoje escrevi carta alucinada ao pai, e em algum momento disse: não levo muita fé em muita coisa). Pára um caminhão do Guaraná Antárctica bem na frente do relógio, não vejo mais horas nem o frio que faz, fico som sono.
(Saliente-se: o espelho no banheiro masculino da Taberna do Leme é tão alto que tive que me pôr em pontas de pés para ajeitar a juba. Denunciem!)