Houve uma explosão.
Enquanto o fogo lambia as tripas do galpão distante, uma massa ovóide de escura fumaça roçava o primeiro dos sete céus estendidos sobre nós, a humanidade. Pensei em desenhos animados.
Alguém acertou a nuca de Heitor com uma lata de aerosol e saiu correndo.
A lata caiu no chão e foi rolando até o mar, vagarosa. Heitor soltou uma praga.
Ajustei meus óculos, sorri e sentenciei: “Aqui no cais do porto é assim”.
Pode-se esperar tudo do cais do porto, menos clemência. Tudo quanto se passa por aqui é sem clemência. Não há clemência nem para vítimas nem para malfeitores, posto que estes sempre estão a apenas alguns galpões de se transformarem em vítimas de outros tantos malfeitores que espreitam silenciosamente, dentre as sombras dos cargueiros em flor. Tampouco estes vilões restarão impunes por muito tempo; breve serão vitimados também por uma nova leva de malfeitores, e a justiça do cais do porto seguirá reinando suprema. No cais do porto não há lei, meu caro Heitor – há justiça. A forma mais crua de justiça; sua configuração mais primitiva. Aqui não se transige, aqui não se barganha, aqui é o Velho Testamento.
“Por que você me trouxe aqui, então?”, indagou meu amigo.
“Os marinheiros, Heitor – os marinheiros!”
4 comentários:
quero mais!
( anna )
Pergunto-me onde você vai parar, e onde esteve por tanto tempo...
Até os motivos que nos levam ali são primitivos.
Sempre tem os "marinheiros"... sempre.... : )
Lindo texto!!!!!!!!!
Vou te ler... sempre. Assim como o fato de sempre existir os marinheiros...
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