Há alguns meses me mudei para esse bairro que se chama Laranjeiras e fica longe e perto de tudo no Rio de Janeiro ao mesmo tempo. Não bastasse, a rua onde moro é como um principado no bairro já bastante próprio das Laranjeiras: a General Glicério, referida comumente por General, onde aos sábados, fazem música na praça e as gentes se conversam. É um lugar bonito, cheio de árvores, e emoldurado duma lógica toda própria. Um golfo de gente bem-apessoada de andar fácil e os rapazes estão sempre com instrumentos musicais a tiracolo. Escrevi um texto sobre isso, "Primeiras Impressões Sobre Um Bairro Novo". Mas não deu conta.
Desde então, andei entretendo a idéia dum "Diário de Estância". Cogitei um outro blog, alguma coisa que determinasse o quão paralelo o projeto de fato é. Cheguei a pensar se não seria esse o próximo livro. E seria mais ou menos assim: todos os dias, eu levaria meu escudeiro caderno até a praça e escreveria o que desse na veneta, torcendo para que aquilo de alguma forma se comunicasse com e comunicasse os arredores. Não sei explicar direito, mas é um lugar muito, muito próprio. O projeto já me veio epigrafado, até -- um verso do Pablo Araújo que nunca me saiu da cabeça, e é das coisas mais interessantes que já escutei: "Toda viagem é traição".
Pois, há coisa de alguns dias recebi convite do Sr. Visnadi para fazer parte do blog "Sete Linhas", e percebi que seria uma boa oportunidade de ensaiar o "Diário de Estância". Pensar a coisa praticando. Comecei hoje, e estou bastante empolgado a respeito. Daqui em diante, todas as quintas me abanco na praça com o escudeiro caderno e escrevo o que me chegar. Depois corro para casa, dou uma mexida aqui e acolá, e posto no blog. Gosto de pensar que é um exercício de soltura e possibilidade. Bainhas mal-feitas e tudo o mais. E tem aquele poema da Alice que volta e meia me chuta as canelas no meio da rua, o "Semínima": "Aqui, quase não temos lixo. A comida, vá lá, já tira a graça da coisa, mas lixo, lixo mesmo, bugiganga, isso a gente não joga fora."
É, é isso aí. Vamos revirando até encontrar alguma coisa.
Um comentário:
tenho sempre alguma coisa muito específca para te dizer quand te leio, mas que nunca se deixa formular, hoje veio o entendimento de um verso de Paul Celan:"sabe você, o que se escreve no seu olho/ aprofunda-nos a profundidade". O olho do Ismar em Laranjeiras, o olho que vê e escreve sobre ('sobre' no sentido de 'por cima de', como traição) e se deixa ser escrito por: 'weisst du, was sich in dein Aug schrieb/ vertieft uns die Tiefe'. não é nada disso. quando eu leio Ismar, o que me acontece é amor.
Postar um comentário