domingo, 22 de fevereiro de 2009

Nas Imediações


Os primeiros sete poemas do "Synchronoscopio", disponíveis nesse endereço aqui.

E um inédito de nome "As Apostas", no blog do Plástico Bolha.

Carnaval na Lama



Moral em baixa. Sistema imunológico, idem. É força que algo genial aconteça nos próximos três ou quatro dias.

sábado, 14 de fevereiro de 2009

Concessão do Amor


Ais de ceia posta. Tua noiva – inconsolável!
E teus pais não param de dar pancadinhas
ao ventre rendado da infeliz, orando que reste lá dentro
algo de teu que se possa aproveitar. Um radiograma
tocado a 4 mãos: “de parte para a Concessão do Amor”

de parte
para a Concessão do Amor
yeah yeah

agora, com este emprego de copidesque
na Gazeta dos Escoteiros, em três meses
serei homem de posses. E todos a bordo
para a Concessão do Amor!, onde os mais grados
membros do escol social fluminense
vêm cometer suas trapaças
& pecadilhos. Onde mansos
pasçam os presbíteros de nossa infância,
mugindo a intervalos para o sol, e o serviço
de quarto canta. Corre à boca pequena
que os mastros da cama são de confeito,
nunca nos faltará nada doce para rilhar. É teu irmão mais velho
este que chora discreto sobre uma primeira edição
das “Questões de Matemática”? Ora, não olhe
para baixo – eu te levo, e eu te levo de trem,
sirva-se de ostras no vagão-restaurante,
uísque com soda, correr é erudição

& na cabina, lemos romances policiais
a costa passando de permeio
(não saberia te explicar por quê,
mas é esta a imagem que mais me assombra)

leve seu pulôver favorito, e um chapéu
para o caso de nos sentirmos seresteiros –
todos a bordo para a Concessão do Amor,
yeah yeah! berram-nos dos alto-falantes,
quem? senão as Grandes Mentes Sem Deus
Deste Desconjuntado Século, escuta,
se o mundo inteiro já escreveu O Livro –

então eu seguro a porta do elevador
lamento um pouco mais teus olhos verdes
e te aquarelo, mais uma vez, a questão

Do Jeito Que Eles São


“And I envy you the valley that you found”
- Joni Mitchell


beleza – e punhos,

talvez – o sol em fevereiro
quando põe brasa nas abotoaduras
deles me faz pensar

beleza, punhos – força,
talvez. Imagino onde
chegaram – um milagre
terraplenado
ou milagre nenhum

imagino com
segredo quando o sol
em fevereiro faz estranhas
luzes nas botinas
deles – eles que aterram
as manhãs com suas botinas
sumosas de graxa – me faz

pensar beleza, o punho – fevereiro
hasteia o sol sobre pinhas
de gente – cruzamentos
súbito desatam-se – quando

em fevereiro vamos
coagulando
nos bancos altos
dos ônibus, o Aterro

do Flamengo, e antes de morrer
o dia tosse tinas de sangue (daqui
a pouco é Carnaval)

Amenidades


publicado no Plástico Bolha, número 25, por convite da Lilica.

domingo, 8 de fevereiro de 2009

Mankiewicz



"So many people know me. I wish I did. I wish someone would tell me about me."

"Infants behave the way I do, you know. They carry on and misbehave. They’d get drunk if they knew how, when they can’t have what they want. When they feel unwanted or insecure or unloved."

(dois trechos de "All About Eve", escrito e dirigido por Joseph L. Mankiewicz)

De Como Contraí Uma Moléstia Social Penetrando Um Penetrável do Oiticica, Fevereiro de 2009


"meu work in progress está progredindo"
- Hélio Oiticica em carta a Mário Pedrosa, 1971

fi-lo

à moda

bareback

deixei

as chinelas

no balcão

fiz-me

à estradinha de brita

às palmilhas

willing a coisa toda

a me doer,

que me doesse, então

no descalço

a boa arte

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

Terminológica

grude doce
Gom'Amor
masca masca
você stacata:

o único critério que me interessa em arte
é a perenidade

ora, ora, o que temos aqui


não sou reacionário não, só acho que quando duas pessoas optam pela juntidão é porque elas acreditam em alguma sorte de futuro em comum, não te parece o caso? Isso de viver o momento

bom, parece que temos uma questão
de cunho terminológico em nossas mãos


é claro que faço concessões para a Arte dita Performática, mas convenha cá comigo, qual a última performance que você viu que não te fez nenhuma vontade de enterrar a cabeça num buraco?

Amor: Performance
o amor é um circo nu
não sei se gosto do seu tom de
voz


isto é voga, como toda a voga, é leviana, quebra
ao meio se tenta assuntar as emoções mais elevadas

este é o tipo de lugar que você freqüenta quando tem veneta
de emoções mais
elevadas? Baby, você consegue ser ainda mais ingênuo
do que eu

Os Sábados Silenciosos


"Desde o incidente com o Lysoform, minha sogra, a Benemérita – temendo, não sem razão, pelas vidas de seu único filho macho e de seu único neto – me manda, de quinze em quinze dias, o equivalente a um carrinho de compras cheio daquilo que ela costuma chamar suas “poções do lar”. Elas me aparecem em garrafas Pet de refrigerante, todas doadas por seus vizinhos, posto que minha sogra não tem o hábito de beber outra coisa que não café, nem água ela consegue tragar. Com punho bastante firme para uma senhora de seus anos, ela escreve o destino final de cada preparado em etiquetas brancas com bordas vermelhas, as mesmas que uso nos livros escolares do pequeno. Não sei se as cola às garrafas antes ou depois do transvaso, mas nunca estão úmidas, nem minimamente rugosas.

Na tarde em questão, fui até a despensa e peguei a garrafa com a etiqueta 'Sala'. Pus seu conteúdo num balde e empunhei o esfregão: um portento de apetrecho, esse esfregão. Bem tentacularizado, com cabo polido, carmesim. Quando vi o anúncio na tevê pela primeira vez, figurei de imediato uma lula empalada num palito gigante, e minha alma, ou o que quer que seja, sofreu uma espécie de repelão. Pareceu-me muito claro que, enquanto aquele objeto não me pertencesse, minha vida estaria drenada de todo e qualquer sentido. Rapidamente tomei nota do número de telefone que piscava no canto esquerdo da tela, e meus olhos marejaram quando declinei para a atendente os dados relativos ao cartão de crédito de meu marido.

'Você não dimensiona o quanto estou empolgada'.

Apanhei-me fazendo a mesma ponderação com minha cunhada Ana, a Preterida, poucos dias antes da chegada do esfregão. Por sinal, é por intermédio de Ana que me aparecem as garrafas Pet com as “poções do lar” de minha sogra, no curso de visitas que nunca ultrapassam a marca de vinte minutos. Isto, diga-se de passagem, é uma benção para todos os envolvidos. Das irmãs de meu marido, Ana é a única que restou na casa da mãe, um autômato de ar constrangido a quem cabe a degradante tarefa de bater à porta de todos os vizinhos do andar de tempos em tempos, mendigando garrafas vazias de refrigerante."
(de "Os Sábados Silenciosos")