domingo, 26 de abril de 2009

Diretamente da Ilha da Madeira, Nosso Correspondente Ismar Tirelli Neto


Fui entrevistado por Margarida Patriota, apresentadora do programa "Autores e Livros", da Rádio Senado.

Para quem ainda precisa de provas quanto a minha absoluta falta de traquejo social, o áudio se encontra .

quinta-feira, 23 de abril de 2009

Bernadette Mayer


"34. Choose a subject you would like to write "about." Then attempt to write a piece that absolutely avoids any relationship to that subject. Get someone to grade you."

"39. Write a work gazing into a mirror without using the pronoun I. "

"44. Write a soothing novel in twelve short paragraphs."

"47. If you have an answering machine, record all messages received for one month, then turn them into a best-selling novella."

"72. Write a work that intersperses love with landlords."

(82 Writing Experiments, Bernadette Mayer)

Cigarreiras


muitas dessas coisas se passam
como se a Morte não nos implicasse, eu te amo
soa (arriscadamente) como correias se partindo
Billie Holiday soa como cacos de vidro dentro duma saca de lixo, tinindo ela mesma
Olhando pra trás, o gato gigante sob o qual no outono me deito solta pêlos sobre os lençóis escuros
piche não chove, mas

soa como
uma cigarreira se abrindo num escritório
prestes deserto, inscrita:
não consigo trabalhar. Volte
Vazia como a luz

nenhum instante seco desde a noite aluir

Em Andamento



Devo falar logo no início do evento, lá pelas 19:45. Quem puder, apareça!

terça-feira, 21 de abril de 2009

Tentando Traduzir LeRoi Jones


Como um possível amante

pratica
o silêncio, o modo do vento
estourar
sua primeira acalmada. Manhã fria
até a noite, vamos tão
vagarosamente, sem
pensamento
de nós mesmos. (Basta
ter pensado hoje
à noite, nada o
acaba. O que
você é, não terá
certeza, ou
fim. Que você
restará, onde está,
um gentil humano fio
de vida. Ah... )
pratica
a solidão,
como uma virtude. Uma só
especiosa necessidade
de manter
o que você
nunca realmente
teve.



***


As a possible lover


Practices
silence, the way of wind
bursting
its early lull. Cold morning
to night, we go so
slowly, without
thought
to ourselves. (Enough
to have thought
tonight, nothing
finishes it. What
you are, will have
no certainty, or
end. That you will
stay, where you are,
a human gentle wisp
of life. Ah...)
practices

loneliness,
as a virtue. A single
specious need
to keep
what you have
never really
had.


(de "The Dead Lecturer", 1964)

domingo, 19 de abril de 2009

Isto Tudo É Muito Sério


"Holding to my cradle at the start
But now my hand is open
And now my hand is ready for my heart"
(Laura Nyro, "Timer")

***

"Arm in arm, we are the harmless sociopaths
oh, arm in arm with all the harmless sociopaths
in the calcium mines buried deep in your chest
oh, the calcium mines buried deep in your chest"
(Andrew Bird, "Oh No")

Todas estas maravilhas imóveis sob Vésper dentro // de abril!


(segue um apanhado de textos escritos com o único-umbigo propósito de me encorajar. A mim mesmo. A não parar de fazer coisas.)

***

NOS BALANÇOS

Contentamento;
Liberdade que
Não abisma.

Só me falta agora um cinto de segurança.

O quê?

Um cinto de segurança!
(19 de Maio de 2002)

***

"E mesmo se não houver paz, por que não fazer algo do desassossego ? Também o tempo escorre por você. Há raias, há fronteiras, há limites – e agora olhe bem de perto, bem de perto, o seu próprio peito, se for possível. Há raias ? Limites, fronteiras ? Não. Você sabe que não. Estas são as verdades do mundo. Este é o tomo inaugural da sua vida. Você está AQUI e isto é tudo que precisa saber."
(2004)

***

A um Cantor

Claro está que nada feito. Jogaste a tempo, perdeste. Jogaste a nervos, perdeste. ´Gora güenta a mão, José, que não lhe presta serviço nenhum prantear a hora morta. Respira a fundo (diafragmal, abdominal), não deixa o período quebrar, faz a canção surgir das costelas. Chegue de dentro; te aporte, te finque, te deixe inundar. Ajuda um conhaque, com raspa de gengibre. O que mais te serenar, visando ao bom abraço do inadequado, do dúbio, do quase. Outra ou uma nota há de rir-se das alturas, e o tom extraviado no dédalo de sons, mas não te inquiete. Chegue de dentro que o caminho vai na metade.
(Novembro/2006)

***

“nobody, not even the rain, has such small hands”
(e. e. cummings)

quando salto do elevador no terceiro andar, há um duto fortuito de janelas que me leva até a minha, esqueci amarela-ecologicamente-bronca antes de sair pra comprar cigarros. Parece ser o tempo da remenda, então vamos lá. Esse bocado você pula, se quiser. Não dou caução de que adiante alguma coisa. Isso não é pra adiantar, você que me lê tão de perto. Já devíamos saber disso, mas também, já devíamos saber de muita coisa. No confessions, please, sorri a Grande Dama daquela fita francesa ó tão Centro Cultural Banco do Brasil. E esse cummings é mesmo um pé em porta arrombada, ou pelo menos, imagino que seja. Desses poemas de sobrevida desconcertada em cadernetas margeadas, votos de casamento em gestação. Talvez o pessoal do escritório sentenciasse – old. Isso é tão old. Isso é tão velha guarda, isso é tanto rubricar sonhos com longínquas estações de trem, Leite Moça, tênis que não fazem bolha nunca. Claro que estou constrangido – mas até que ponto isso me safa?

“Nada é simples e tudo é bastante banal”. Detento/detentor dum sonho, de dentro dessas cadernetas margeadas onde os poemas de amor dos outros seguem devassando colheitas – falar. Sozinho. Po-e-mas-de-a-mor. Recuperamos o sentimento teoricamente (kitsch) porque parece inadmissível de qualquer outro jeito. Damos prosseguimento às canções porque somos generosos, somos bons de coração, e tudo, tudo é tão emblemático.

E que dizer do nosso escrúpulo? Chegamos a beirar o acadêmico, jaquetas de tweed com remendo de couro no cotovelo (“a pathological fix”), uma eloqüência francamente maníaca. Sabemos onde começam as coisas, intuímos onde vão dar. Razoamos tudo. Mas não conseguimos olhar um na cara do outro. Talvez não seja este o plano do Amor, de qualquer forma. Mas talvez seja absolutamente essencial olhar um na cara do outro. Talvez seja capital ("paramount") olhar um na cara do outro, e calar, se possível. Talvez não seja possível parar de falar - mas talvez seja possível olhar (um) na cara do outro. Pelo menos. De todo modo, é preciso fazer caminhos para abril. O mais cruel dos meses -- não necessariamente. Aqui, muito situacionado, é uma estação branda de sol e amenidade. Não necessariamente, mas (contamos com pelo menos duas pancadas de chuva por dia). O mais cruel dos meses? Por Deus, isso é tão old."
(Abril/2009)

Il cielo non è piu con noi


e essas coisas de;

achar que torcem a meu favor ou contra

e de que tudo se resolve no último minuto -

é preciso não levá-las mais em questão

é preciso descer mais um (tão telúrico) Real

(e o poema esposa, afinal,

o trocado da passagem. Glória,

glória,)

e voltar p'ra casa

onde vez em quando sucede

um telefonema

vez em quando não

sobretudo não

me sentir melindrado

o poema deve, afinal,

acontecer

o dia

essas coisas de me melindrar

não, já não me servem mais

e essas coisas de

achar que estão contra ou a meu favor

e de que as coisas devem, no último instante,

(sabe?)

então, nada

tem a obrigação de se resolver

no último minuto

isto é cinema

isto é devastadoramente cinema

e estas coisas

são coisas muito peculiares

a uma natureza romântica. Eu não sou um tipo romântico.

Não serve mais ser um tipo romântico.

(Aleluia!)

"Todo sentimento é maravilhoso e horrível ao mesmo tempo. A questão é que, bem p´ra além disso, são todos muito pouco práticos. Estou tentando mantê-los à parte do escopo geral das coisas. Estou trabalhando. Pela primeira vez na vida estou trabalhando e

não tenho mais tempo pra isso".

quinta-feira, 16 de abril de 2009

Reality Roll


faz o mundo girar Inclusive às quartas
-feiras, um nó irreticente Penha branca
bem no meio da semana Ó, todas estas
maravilhas imóveis sob Vésper dentro
de abril! Hoje vi seis pessoas minhas
conhecidas andando pela rua
não cumprimentei nenhuma
Não tenho me sentido muito mútuo Ultima
mente Pela manhã me enroscar todo
sobre o capacho frente à casa dos teus pais
tiquetaqueando como uma colegial má-intencionada
& todos esses velhos amuletos guiando
minúsculos carros brancos pelas ruas da cidade
Andam dizendo coisas horríveis a meu respeito
durante a pausa do café Eu sei
com os cheiros e as manchas e os furos na camiseta
Eu, que costumava ser tão bom com nomes O
medo de perder o que já está perdido Tempo
bom, um poema deve acontecer
o dia

segunda-feira, 13 de abril de 2009

Michigan J. Frog


G. pergunta:

o que tomo por amor
afinal?

ato contínuo brota
de meu casposo couro
cabeludo reluzente
cartola; da mão direita
uma bengalinha;

as solas dos pés
mudam-se em cascos

pouco depois G. torna:
você está sapateando – dá
pra você por
favor parar de sapatear? Eu te fiz
uma pergunta

com isso a paga da orquestra
fantasma; seus fraques sublocados;
a espalhada pela noite
de lotações; trens; ônibus
adentro
desço da cadeira

sorrindo ainda, & muito cioso
de que estamos num botequim;

plena esquina; Constante

com Nossa Senhora; ainda
não sei que Fúrias é isso,
(que tomo por) amor

Sontag sobre Leiris


“Em vez de uma história de sua vida, (Michel) Leiris nos apresenta um catálogo de suas limitações. A Idade do Homem não inicia com “Eu nasci em...”, mas com uma prosaica descrição do corpo do autor. Ficamos sabendo nas primeiras páginas da incipiente calvície de Leiris, de uma inflamação crônica nas pálpebras, de seu pobre desempenho sexual, de sua tendência a curvar os ombros quando senta e a coçar a região anal quando está sozinho, de uma traumática tonsilectomia à qual foi submetido em criança, de uma infecção igualmente traumática no pênis; e, subseqüentemente, de sua hipocondria, de sua covardia em todas as situações do menor perigo, da incapacidade de falar fluentemente qualquer língua estrangeira, de sua deplorável incompetência nos esportes físicos. Seu caráter também é descrito sob o aspecto da limitação: Leiris apresenta-o corroído por fantasias mórbidas sobre a carne em geral e as mulheres em particular. A Idade do Homem é um manual de abjeção – anedotas, fantasias, associações verbais e sonhos vazados nos tons de um homem, em parte anestesiado, que com curiosidade põe o dedo em suas próprias feridas.
O livro de Leiris pode ser considerado um exemplo especialmente vigoroso da respeitável preocupação com a sinceridade peculiar às letras francesas. (...) Mas analisar o livro de Leiris apenas sob este aspecto é fazer-lhe uma injustiça. A Idade do Homem é mais estranho, mais cruel do que tal parentesco sugere. Muito mais do que qualquer confissão revelada pelos grandes documentos autobiográficos franceses sobre sentimentos incestuosos, sadismo, homossexualidade, masoquismo e grosseira promiscuidade, Leiris consente ao obsceno e ao repulsivo. O que choca não é particularmente o que Leiris fez. A ação não é o seu ponto forte, e seus vícios são os de um temperamento sensual espantosamente frio – fracassos e deficiências rastejantes mais freqüentemente do que atos sensacionais. É que a atitude de Leiris não se deixa redimir pela mais leve nuance de respeito próprio. Esta falta de estima ou respeito próprio é obscena. Todas as outras grandes obras confessionais das letras francesas brotam do amor-próprio e têm o objetivo claro de defender e justificar o eu. Leiris se detesta, e não pode defender nem justificar”.
(Susan Sontag no ensaio “A Idade do Homem, de Michel Leiris”, em “Contra a Interpretação”).

Credo


“Não penso nada diante de Uganda. Na volta dos campos de concentração, também não pensava nada. Se penso alguma coisa, ignoro o que, sou incapaz de enunciá-la. Vejo. Fujo dessas pessoas que mal acabando de tomar conhecimento dessas coisas ou de vê-las já sabem pensar, e o que, e o que dizer, ou como concluir. É preciso evitar essas pessoas porque elas querem antes de mais nada perder aquele saber, afastá-lo de si passando à sua resolução imediata, é preciso fugir dessas pessoas que falam dos remédios e das causas, que falam da música na música, que, enquanto se toca uma Suíte para violoncelo, falam de Bach, que, enquanto se fala de Deus, falam de religião.”
(Marguerite Duras, “O Verão de 80”)

domingo, 5 de abril de 2009

Não Por Acaso


"Sabemos que, historicamente, o surgimento da pintura de paisagem coincide, não por acaso, com o do auto-retrato, o que nos leva a pensar que a exterioridade só é plenamente ´percebida´ quando a própria interioridade do sujeito se faz sentir e passa a se constituir como uma questão para ele".
(Lígia Saramago no artigo "A arte e a (re)criação da paisagem")

sexta-feira, 3 de abril de 2009

As Cantigas Que Eu Ouço No Escritório, 1



C´mon back if the moment lends
You can look up all my very closest friends

Light, light enough
to let it go
It's light enough to let it go

quarta-feira, 1 de abril de 2009

Em Glorioso Technicolor


telefonema
para o escritório,

tiro o dia
de tabula
rasa

pego todas
essas notas
a mim mesmo,

vou fazer
turismo

outono, quão
fenomênico de sua parte